Notas sobre a defesa da concorr�ncia no Tratado de Roma.
Se a pol�tica de defesa da concorr�ncia � um dos eixos essenciais da economia de mercado, � l�gica a sua import�ncia para a realiza��o do mercado interno, uma vez que este existe para possibilitar a concorr�ncia entre as empresas de todos os Estados-Membros e alargar o leque de escolhas poss�veis para os consumidores. A pol�tica comunit�ria relativa � concorr�ncia visa, pois, favorecer a efic�cia econ�mica, criando uma oportunidade crescente � inova��o e ao progresso tecnol�gico, ao mesmo tempo que evita ou restringe eventuais pr�ticas anticoncorrenciais que possam afectar a transpar�ncia e a fluidez das trocas entre agentes econ�micos.
De modo mais detalhado, podemos dizer que a pol�tica europeia da concorr�ncia deve garantir a unidade do mercado interno e evitar a monopoliza��o de quaisquer sectores, bem como acordos proteccionistas entre empresas . Outra preocupa��o patente na defesa comunit�ria da concorr�ncia � eliminar todas as formas de explora��o abusiva do poder econ�mico face a agentes econ�micos mais d�beis (abuso de posi��o dominante). Por �ltimo, a pol�tica europeia da concorr�ncia procura impedir que os Governos dos Estados-Membros falseiem as regras do mercado mediante aux�lios estatais .
Vejamos agora, ainda que de modo necessariamente breve, alguns dos aspectos previstos no articulado.
A este respeito, o n�1 do artigo 81� do Tratado CE pro�be os acordos e as pr�ticas concertadas entre empresas que �sejam suscept�veis de afectar o com�rcio entre os Estados-Membros e que tenham por objectivo ou como efeito impedir, restringir ou falsear a concorr�ncia no mercado comum�. Esta proibi��o � aplic�vel tanto a acordos horizontais (entre empresas no mesmo est�dio de produ��o, de transforma��o ou de comercializa��o) como verticais (entre empresas situadas em est�dios diferentes do processo produtivo). Acresce que alguns
tipos de acordos s�o proibidos de forma directa, como sucede nos casos seguintes :
1) acordos horizontais ou verticais que fixam directa ou indirectamente os pre�os;
2) acordos sobre as condi��es de venda;
3) acordos destinados a isolar segmentos do mercado, designadamente no que se refere a redu��es de pre�os,
4) acordos sobre quotas de produ��o ou de fornecimento;
5) acordos relativos a investimentos;
6) estabelecimentos de venda comuns;
7) acordos de reparti��o do mercado;
8) mercados colectivos exclusivos;
9) acordos que implicam discrimina��es de parceiros comerciais;
10) boicote colectivo;
11) acordos de autolimita��o cuja finalidade consiste em renunciar a determinados actos de concorr�ncia.
Quanto aos
abusos de posi��o dominante, o artigo 82� (ex-artigo 86�) do Tratado declara �incompat�vel com o mercado comum e proibido, na medida em que tal seja suscept�vel de afectar o com�rcio entre os Estados-Membros, o facto de uma ou mais empresas explorarem de forma abusiva uma posi��o dominante no mercado comum ou numa parte substancial deste�. Ora, podemos definir posi��o dominante como uma situa��o de supremacia econ�mica de determinada empresa, situa��o essa decisiva para lhe permitir alterar a concorr�ncia efectiva no mercado em causa. Por outras palavras, essa empresa tem condi��es para influenciar de modo significativo os moldes em que tal concorr�ncia se desenvolver� e de agir sem ter em conta essa concorr�ncia.
No entanto, cabe sublinhar que s� h� abuso de posi��o dominante quando o comportamento de determinada empresa � suscept�vel de efectivamente influenciar o mercado em apre�o. De acordo com o dispositivo legal, s�o
exemplos deste tipo de abusos :
1) impor, de forma directa ou indirecta, pre�os de compra ou de venda ou outras condi��es de transac��o n�o equitativas;
2) limitar a produ��o, a distribui��o ou o desenvolvimento t�cnico em preju�zo dos consumidores;
3) aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condi��es desiguais face a presta��es equivalentes;
4) subordinar a celebra��o de contratos � aceita��o, por parte dos contraentes, de presta��es suplementares que n�o t�m liga��o com o objecto desses contratos.
Em mat�ria de
concentra��es, existe o
Regulamento (CEE) n� 4064/89 , o qual estabelece que �devem ser declaradas incompat�veis com o mercado comum as opera��es de concentra��o que criem ou reforcem uma posi��o dominante de que resultem entraves significativos � concorr�ncia efectiva no mercado comum ou numa parte substancial deste.�
Pode, pois, concluir-se que existe concentra��o quando uma empresa adquire o controlo exclusivo de outra empresa, ou quando v�rias empresas adquirem o controlo de outra ou criam uma nova empresa. � luz daquele Regulamento, a Comiss�o tem o poder de examinar as opera��es de concentra��o antes da sua realiza��o (acto de controlo pr�vio), a fim de determinar a sua compatibilidade com o mercado interno, tendo em conta a avaliz��o segundo determinados crit�rios, como sejam:
1) a determina��o dos mercados de produtos relevantes ;
2) a determina��o do mercado geogr�fico relevante; e
3) a aprecia��o da compatibilidade da opera��o de concentra��o em causa com o mercado interno em fun��o do crit�rio da posi��o dominante.
No tocante aos
aux�lios estatais, o artigo 87� (ex-artigo 92�) do Tratado declara incompat�veis com o mercado interno �na medida em que afectem as trocas comerciais entre os Estados-Membros, os aux�lios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, desde que falseiem ou ameacem falsear a concorr�ncia, favorecendo certas empresas ou certas produ��es�.
Ser� considerado como aux�lio estatal qualquer tipo de vantagem concedido pelos Estados desde que:
1) confira uma vantagem econ�mica ao seu benefici�rio;
2) seja atribu�do de forma selectiva a certas empresas ou a certas produ��es;
3) ameace falsear a concorr�ncia; e
4) afecte as trocas comerciais entre os Estados-Membros.
A proibi��o �, como se compreende pela amplitude das al�neas anteriores, aplic�vel a um grande n�mero de aux�lios, quer estes sejam directos ou indirectos e independentemente da forma que assumam . Ora, de acordo com esta perspectiva abrangente, a forma, o motivo e a finalidade do aux�lio n�o s�o determinantes para a sua proibi��o, antes relevando o seu efeito sobre a concorr�ncia. Nestes termos, n�o ser�o apenas vistas como aux�lios as presta��es positivas, mas tamb�m todas as medidas que visem reduzir os encargos financeiros da empresa benefici�ria, independentemente da forma de concess�o do aux�lio, a qual � irrelevente para o efeito
No entanto, o legislador comunit�rio tem a clara no��o de que seria quase imposs�vel pretender consagrar uma proibi��o absoluta dos aux�lios estatais. Com efeito, o artigo 2� do Tratado destaca como um dos objectivos da Comunidade a promo��o do desenvolvimento harmonioso e equilibrado das actividades econ�micas em todo o espa�o comunit�rio; logo, e tendo em conta que o desenvolvimento econ�mico � ainda t�o vari�vel entre os diversos Estados-Membros (e mesmo entre regi�es no interior de alguns destes Estados), torna-se inevit�vel assumir a necessidade, ainda que pontual e bem alicer�ada, de interven��o dos Estados .
Temos, pois, que a Comiss�o deve garantir a total compatibilidade dos aux�lios atribu�dos pelos Estados-Membros com o mercado comum. Da� a previs�o contida no artigo 88� (ex-artigo 93�) do Tratado, segundo a qual os aux�lios devem ser notificados � Comiss�o e ser por esta aprovados previamente � respectiva execu��o .
J� no que diz respeito �s
empresas p�blicas , bem como �s empresas a que os Estados-Membros concedem direitos especiais ou exclusivos, o n�1 do artigo 86� do Tratado vem proibir que estes tomem ou mantenham qualquer medida contr�ria ao mercado comum, nomeadamente em mat�ria de defesa da concorr�ncia (muito embora, atrav�s do n�2 do mesmo artigo, se encontre previsto que as empresas encarregadas da gest�o de servi�os de interesse econ�mico geral ou que tenham a natureza de monop�lio fiscal s� ficam submetidas �s regras da concorr�ncia na medida em que a aplica��o destas regras n�o constitua um entrave ao cumprimento da sua miss�o). Assim, e porque as regras comunit�rias em mat�ria de concorr�ncia s�o em princ�pio aplic�veis integralmente �s empresas a que o Estado confiou o desempenho de servi�os de interesse econ�mico geral, temos que, nos termos do princ�pio da proporcionalidade consagrado no n�2 do artigo 86�, a aplica��o das regras do Tratado deve limitar-se � medida em que tal seja necess�rio para ao cumprimento (por parte da empresa em causa) da miss�o espec�fica que o Estado lhe confiou .
Em mat�ria de procedimento, incumbe � Comiss�o velar pelo respeito das regras europeias da concorr�ncia, podendo actuar :
1) por iniciativa pr�pria,
2) na sequ�ncia de queixas dos Estados-Membros, de empresas ou de particulares;
3) na sequ�ncia de notifica��es de acordos por partes das empresas;
4) na sequ�ncia de notifica��es de aux�lios estatais projectados por um Estado-Membro.
Naturalmente, antes de tomar uma decis�o a Comiss�o ouve os interessados (empresas e/ou Estados-Membros), mediante audi��es realizadas para esse fim.
As empresas ou os Estados-Membros destinat�rios de uma decis�o da Comiss�o podem contest�-la perante o Tribunal de de Primeira Inst�ncia e o Trbunal de Justi�a das Comunidades .
O
XXXI Relat�rio sobre a pol�tica de concorr�ncia da UE denota um ampla actividade nos tr�s principais dom�nios que aquela reveste, a saber: o controlo das opera��es de concentra��o de empresas , a ac��o antitrust e a fiscaliza��o do teor dos aux�lios prestados pelos Estados aos agentes econ�micos.
Na verdade, o objectivo declarado de �garantir que a concorr�ncia funcione sem distor��es, a fim de assegurar uma maior possibilidade de escolha aos consumidores, a inova��o tecnol�gica e a concorr�ncia a n�vel de pre�os� s� � vi�vel se as empresas optarem por pr�ticas de transpar�ncia e de leal concorr�ncia, em detrimento de quaisquer atitudes concertadas de deturpa��o do mercado ou de abuso de posi��o dominante.
Nestes termos, o citado Relat�rio sublinha a import�ncia da luta contra os cart�is, cuja exist�ncia � considerada fortemente lesiva do mercado, uma vez que �t�m por �nico objectivo reduzir ou eliminar a concorr�ncia, n�o produzindo qualquer efeito ben�fico para a economia e n�o podendo, por conseguinte, benefiar de um balan�o econ�mico favor�vel. Os seus �nicos efeitos s�o negativos, na medida em que reduzem a escolha dos consumidores, provocam um aumento dos custos e uma redu��o da competitividade da ind�stria, um atraso nas adapta��es necess�rias das empresas e desvantagens no dom�nio da inova��o�.
Tamb�m as quest�es relacionadas com o alargamento foram alvo de natural desenvolvimento ao longo do per�odo coberto pelo XXXI Relat�rio .
Outro aspecto a salientar no contexto comunit�rio de defesa da concorr�ncia deriva do car�cter extensivo do mercado, que se convencionou designar por globaliza��o. Ora, com base nesta realidade pol�tica e econ�mica, a UE procura um quadro de coopera��o internacional e multilateral, onde se inscreve a Organiza��o Mundial do Com�rcio (OMC) .
A.Roque